Em entrevista à Folha de S. Paulo reproduzida em destaque pelo UOL, a economista Ana Toni cobrou do governo um plano definido para a utilização dos “recursos do petróleo” no processo de transição energética que a longo prazo deveria substituir em todo o país a queima de derivados de petróleo por fontes de energia alternativas e não prejudiciais ao meio-ambiente.
Como exemplo do que considera a situação atual – e da inação ou indiferença do governo, poderíamos deduzir – a economista citou o modelo adotado pela Noruega, “uma estratégia clara” que direciona fundos do petróleo para essa transição “com uma abordagem específica”.
Ana Toni, segundo a Folha, ressaltou ainda “ a emergência climática e a necessidade de o Brasil avançar no debate sobre o setor de óleo e gás, enquanto o governo mantém a exploração do petróleo em seus planos de longo prazo, apesar das crescentes preocupações ambientais”.
A não ser pelo fato de que a entrevistada não estava falando de fora para dentro do governo, a entrevista, sóbria e elegante, parecia um brilhante exemplo de crítica construtiva, numa época de oposição movida a fake news e nem sempre disfarçado discurso de ódio.
Por mais que tenha razão, Ana Toni não poderia dar essa entrevista e fazer essas críticas, porque ela é integrante do governo do qual reclama e porque, ainda mais, é responsável, no cargo de Secretária de Mudança Climática do Ministério do Meio-Ambiente, precisamente pela área que acusa de não ter uma estratégia clara de transição energética.
Na entrevista, a Secretária não fez uma mea culpa, responsabilizando-se pela situação que denuncia, fez na verdade pressão para cima e passou por cima da Ministra do Meio-Ambiente Marina Silva, para cobrar de Lula, na verdade, que ele saia de cima do muro nessa questão do petróleo versus energias alternativas.
Não é a primeira vez, aliás, que partem de dirigentes de órgãos do Ministério do Meio Ambiente iniciativas diretas ou oblíquas contra a Petrobrás. O caso anterior foi a tentativa de veto do Ibama à exploração de petróleo na chamada Margem Equatorial, no litoral do Atlântico entre o Rio Grande do Norte e o Amapá. Ótimo para as petroleiras multinacionais se esse veto tivesse prevalecido: assim, um futuro governo poderia leiloar essas áreas e concedê-las às petroleiras que já exploram o trecho da Margem Equatorial correspondente à Guiana, ali perto, e o fazem sofregamente e predatoriamente, aí sim, num desastre irreversível para a sobrevivência de nosso planeta.
Muita gente no segundo e no terceiro e quarto escalões do governo – e em alguns casos até no primeiro escalão – precisaria aprender e adaptar ao caso brasileiro a lição atribuída pelo então Presidente Lyndon Johnson, dos Estados Unidos, a um velho chefe indígena de seu Texas natal.
– No governo de uma comunidade – dizia o velho, com a linguagem vulgar que Johnson repetia, rindo – existem pessoas incômodas que é melhor você manter dentro da tenda, mijando para fora, do que fora da tenda, mijando para dentro.
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.