Os governos dos países ricos começaram a defender a quebra das patentes de vacinas contra a Covid-19 se seguir o que países como Rússia, China e Cuba vem defendendo: não se deve usar a pandemia do novo coronavírus para obter o máximo de lucro possível em detrimento da vida.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, declarou, na semana passada, o seu apoio à iniciativa de suspender as patentes de vacinas contra a Covid-19. “Na Europa há uma ideia que merece atenção: eliminar a proteção de patentes de vacinas contra a Covid-19”, disse ele.
Putin também disse que a iniciativa está de acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), que prevê a suspensão da proteção da propriedade intelectual em situações extraordinárias. “A pandemia é uma situação extraordinária. Tatyana, peço a você e aos seus colegas que se debrucem sobre este assunto. A Rússia certamente apoiaria tal abordagem”, declarou Putin.
O tema foi discutido na Comissão Europeia e a presidente Ursula von der Leyen declarou, na quinta-feira (6), que a Europa está pronta para discutir a suspensão das patentes defendida pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. No Brasil, o Presidente da República continua atuando em favor os lucros da indústria estrangeira.
Luis Felipe Miguel, professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB), não vê saída para o Brasil. Numa análise que publicou nas redes sociais, ele diz que “é impossível negar a importância da decisão do governo Biden de apoiar a suspensão da patente das vacinas. Não que tenha efeito imediato – a OMC opera de forma lenta”.
Na opinião dele, a “mudança de posição dos Estados Unidos retira da indústria farmacêutica seu maior apoio e torna mais difícil que outros países, como o Brasil de Bolsonaro, se mantenham a favor de privilegiar o lucro de uns poucos em detrimento da saúde e da vida de todos”.
No texto, o professor afirma que “a maior potência mundial admite que podem existir valores mais elevados do que a proteção da propriedade privada. Nos tempos que correm, não é pouca coisa. À esquerda, ainda há quem insista que não há diferença entre Biden e Trump. É a velha tentação do maniqueísmo, em que o mundo se divide entre o 100% bom e o 100% mau. Se Biden não é socialista e anti-imperialista, como de fato nem de longe é, então ele e Trump são iguais. Mas não são. A adesão à proposta de suspensão das patentes mostra isso, assim como as inflexões na política ambiental e na política tributária”.
E completa: “São passos insuficientes, é verdade, mas na direção certa. Indicam um governo que é sensível a pressões, que abre algum espaço para diálogo e que é capaz de admitir que, sem mudanças, a catástrofe será inevitável. Mais uma vez, nos tempos que correm, não é pouca coisa. Não se trata de cair no maniqueísmo oposto é julgar que, sendo diferente de Trump, Biden é portanto nosso amigo de fé, irmão, camarada. Trata-se de aceitar que o mundo é mais complexo. E que exige, portanto, respostas mais complexas do que repúdio apriorístico ou adesão acrítica”.