Uma longa luta na Justiça terminou na última terça-feira (28), com a vitória das 110 famílias da comunidade quilombola do Rio dos Macacos, na Baía de Aratu, em Simões Filho (BA). O Incra entregou o título de posse definitiva da terra de 98 hectares onde vivem cerca de 500 quilombolas. Participaram da entrega o Ministério Público Federal (MPF), que mediou o impasse com a Marinha junto à Defensoria Pública da União (DPU) e a Associação dos Remanescentes de Quilombo Rio dos Macacos.
“É a vitória de uma luta com origem nos processos de resistência negra à escravidão. Os habitantes da comunidade quilombola sofreram diversas violações de direitos humanos durante a judicialização do processo”, destaca o presidente da CDHM, Helder Salomão (PT-ES).
Depois da titulação, o próximo passo é o registro da propriedade das terras em cartório. Assim, a comunidade poderá participar de programas públicos que permitem o acesso à água encanada, esgotamento sanitário, construção de moradias populares e estradas.
“Não é um simples documento, a gente tá assinando nossa carta de alforria”, disse Rosimeire Silva, que coordena a Associação dos Remanescentes de Quilombo Rio dos Macacos, em entrevista à imprensa local.
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) atuou no caso. Ainda em 2012, foi realizada uma audiência pública sobre a situação do território quilombola, promovida pelo deputado Domingos Dutra (MA), então presidente do colegiado. Também em 2012, a CDHM fez diligência ao quilombo para apurar denúncias de abusos e uso de violência pela Marinha contra moradores. Os deputados ouviram relatos de ameaças e agressões. Durante a visita foi assinado um acordo entre o comando da Marinha para que patrulhamento dos militares fosse restrito ao entorno da área ocupada pela comunidade. O objetivo foi reduzir o conflito entre militares e moradores até uma solução definitiva do impasse.
Já em 2020, o atual presidente da CDHM, Helder Salomão, ao lado do deputado Bira do Pindaré (PSB-MA), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Comunidades, e de dez parlamentares da Bancada do PSOL, enviaram ao Ministro-Chefe da Casa Civil, Walter Souza Braga Netto, ofício solicitando “o quanto antes o registro e envio do título do domínio do território em questão à Associação dos Remanescentes de Quilombo Rio dos Macacos, comunicando de imediato o prazo em que isso ocorrerá”.
História
A comunidade está na área desde a época do Império. A luta territorial, porém, teve início nos anos 1970. O conflito começou depois que a Base Naval de Aratu foi construída e a União pediu a desocupação da área pelos quilombolas. Em 2009, os quilombolas pediram a intervenção do MPF para provar que eram remanescentes de grupos que resistiram à escravidão e que tinham o direito de posse das terras. Em julho de 2012, o Incra classificou a terra como área quilombola centenária e estava no local antes da chegada da Marinha. Porém, antes do reconhecimento, a Marinha ajuizou processo judicial e pediu a desocupação do quilombo. O pedido foi aceito pela Justiça, que determinou que 46 famílias deixassem o local.
Já em 2014, o Incra fez a delimitação do território e três anos depois reconheceu a área como quilombo. Desde então, os moradores passaram a aguardar a assinatura de titulação das próprias terras. Em 2018, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) visitou o quilombo.
Segundo os quilombolas, durante o processo de titulação se tornaram alvo de ameaças dos oficiais da Marinha, sendo atingidos por assassinatos, espancamentos e até assédio às mulheres da comunidade.
Com informações da Assessoria de Comunicação-CDHM, da Ascom MPF/BA e do Correio24horas