O ex-governador e ex-senador do Paraná, Roberto Requião, do PT, alertou, em entrevista à TV Comunitária, que a industrialização projetada pelo presidente Lula significa projeto inviável se permanecer o tripé econômico neoliberal, que tem suas raízes no Consenso de Washington, nos anos de 1990: 1 – metas inflacionárias, 2 – câmbio flutuante e 3 – superávit primário.
Para ele, o arcabouço fiscal, aprovado no Congresso, para substituir o teto de gasto imposto pelo neoliberalismo fascista bolsonarista, padece do mesmo vício.
Não passa, na sua avaliação, de limitação orçamentária radical que bloqueia gastos públicos necessários ao desenvolvimento, sem os quais a industrialização não se realiza.
O freio ao crescimento da arrecadação, para alcançar déficit zero em 2024, bem como limites demasiadamente estreitos aos investimentos, agrava a instabilidade econômica e política por revelar o que considera total falta de projeto de desenvolvimento nacional concertado entre governo, Congresso e sociedade.
Sem o projeto, insiste, o presidente Lula fica preso a uma política doméstica de economia de gastos para atender a tirania financeira cuja prioridade não é o desenvolvimento, mas a estagnação advinda do pagamento de juros e amortizações produzidos por política monetarista jurista irracional.
FINANÇAS FUNCIONAIS, O NOVO MODELO
Trata-se, sobretudo, de romper o tripé e adotar novo modelo monetário apoiado nas finanças funcionais em vez de insistir no monetarismo radical praticado pelo Banco Central Independente que freia as potencialidades do país.
Com o modelo de finanças funcionais, o governo não tem limites para gastar em sua própria moeda sem receito de provocar inflação, conforme experiência internacional comprovou, com o crash de 2008.
Abre-se espaço para ampliar a oferta sem pressão inflacionária e os gastos públicos que puxam a demanda global capitalista como norma universal do sistema.
A estratégia macroeconômica adotada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está, na sua percepção, fadada ao fracasso.
Não haverá desenvolvimento sustentável, ancorado em déficit zero orçamentário, cuja dinâmica do crescimento deixa de ser o gasto público, para ser responsabilidade do setor privado.
Não há exemplo de sucesso dessa estratégia no mundo e, para piorar, as experiências de privatização sofrem reversão depois da pandemia nas principais economias dos países ocidentais ricos.
Alemanha, França, Inglaterra, Holanda voltam a estatizar o que privatizaram: hidrelétricas, gás, petróleo etc.
As demandas sociais se multiplicaram e o setor privado chamado a investir diante dessa alta histórica do gasto público imposta pela pandemia não foi capaz de dar conta do recado.
EXPORTAÇÃO DESASTROSA E ENDIVIDAMENTO SUFOCANTE
O Brasil, ao priorizar exportação de óleo cru e renunciar à industrialização dos serviços de distribuição e produção de derivados estancou os investimentos da Petrobrás que eram responsáveis pela alavancagem da demanda global.
A prioridade à privatização da energia elétrica e a política de esvaziamento do poder político do Estado no caso das principais estatais, como Eletrobrás e Petrobrás, arrebentam, segundo Requião, as cadeias internas de produção de valor e bloqueiam as chances desenvolvimentistas capazes de produzir os investimentos dinamizados pelo gasto público.
O domínio da política econômica pelo pensamento financeiro especulativo do mercado bancário só produz um resultado, na sua opinião: expansão incontrolável da dívida pública e o enraizamento da armadilha do endividamento como processo de enforcamento da dinâmica econômico-financeira nacional.
Sair dessa requer, insiste, rompimento do tripé neoliberal e novas práticas monetárias heterodoxas das finanças funcionais, seguidas pelas economias desenvolvidas, incompatíveis com a ortodoxia financeira que deixa Lula aprisionado.
CONGRESSO NA OPOSIÇÃO NÃO É EMPECILHO
Na avaliação de Requião, não se trata de reclamar de um Congresso onde o governo não tem maioria.
Contra essa maioria, Lula tem que ter um projeto nacional para negociar com estados e municípios e, claro, com a classe política.
Amarrado pelo tripé neoliberal, o sonho da industrialização se esfumaça e cresce a resistência conservadora sem discurso, carente do que ela mais deseja: projeto realista para conversar com o seu eleitor.
Da mesma forma, funciona a independência da administração da Petrobrás, diz.
Sem projeto de governo para direcioná-la a agir não no sentido da reprimarização econômica neoliberal colonizadora, limitando-se à exportação de matéria prima(petróleo cru), mas da industrialização libertadora.
Requião, que diz ter apostado toda a sua vida política na eleição de Lula, para ajudar o país sair do neoliberalismo fascista, teme que essa luta possa se frustrar, caso a determinação política lulista de priorizar o projeto de desenvolvimento nacional fique marcando passo prisioneiro do tripé macroeconômico, que somente interessa à Faria Lima.
(*) Por César Fonseca, jornalista, atua no programa Tecendo o Amanhã, da TV Comunitária do Rio, é conselheiro da TVCOMDF e edita o site Independência Sul Americana.
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