País anunciou que fortalecerá os laços com Pequim; Erdogan acredita que Turquia resistirá mais facilmente às taxações de Trump
As autoridades russas expressaram nesta quarta-feira sua “grande preocupação” com a deriva da chamada guerra comercial entre os EUA e a China e afirmaram que fortalecerão sua relação estratégica com o país asiático, que consideram seu “parceiro comercial de longo prazo”.
“A situação que afeta duas grandes economias mundiais, uma das quais é nosso parceiro comercial de longo prazo, é de grande preocupação”, disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, de acordo com a agência de notícias estatal TASS.
Nesse sentido, ela ressaltou que a Rússia tomará as medidas apropriadas para evitar possíveis consequências negativas para sua economia decorrentes dessa nova disputa comercial entre Washington e Pequim, que vem aumentando as tarifas no espaço de apenas algumas horas.
O último golpe veio da China, que a partir de quinta-feira aumentará a tarifa adicional sobre os produtos importados dos EUA de 34% para 84%. Uma decisão que foi minimizada por Washington, que considera que Pequim é a maior prejudicada por esse tipo de ação.
Zakharova, por sua vez, censurou os EUA por contornar as regras fundamentais da Organização Mundial do Comércio (OMC) e optar por abandonar “os princípios do direito comercial internacional” em favor de políticas protecionistas unilaterais.
“Qualquer choque que ameace uma desaceleração no crescimento econômico global e uma queda geral no consumo tem um impacto negativo em muitos processos em todo o mundo”, alertou Zakharova.
Na Turquia, o presidente Recep Tayyip Erdogan garantiu que seu país evitará mais facilmente as “guerras comerciais” que foram desencadeadas após o anúncio de seu homólogo norte-americano, Donald Trump, de impor tarifas, apesar do fato de que elas trarão consigo “um furacão violento que afetará a todos”.
“Superaremos esse período difícil com mais facilidade do que muitos, graças ao fato de estarmos entre os países com tarifas baixas”, disse ele durante uma reunião de seu partido, o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), na qual ressaltou que enfrentarão essa “grande incerteza” graças ao programa econômico do governo.
A Turquia está entre as dezenas de países aos quais Trump impôs tarifas de pelo menos 10%, embora tenha sido tributada anteriormente com outras taxas sobre suas exportações de ferro, aço e alumínio.
“Não prevemos uma situação negativa em termos de comércio, produção e exportações”, disse o presidente turco em um discurso no qual, sem mencionar explicitamente Trump, enquadrou essa onda protecionista nas novas políticas dos Estados para enfrentar um “período de luta”.
“As guerras comerciais que eclodiram por causa das tarifas terão um impacto global. Não seria exagero dizer que está chegando um furacão violento que afetará a todos, grandes e pequenos”, previu ele, informa a agência de notícias Anatolia.
Aqui no Brasil, segundo Rafael Cervone, presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) e primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), avaliou que “o tsunami protecionista do presidente Donald Trump, marcado pelo abrupto aumento das tarifas de importação, está redesenhando o tabuleiro da economia mundial e disparando sinais de alertas no Brasil”.
Ele observa que a elevação da taxa média dos EUA, de 2,5% em 2024 para até 30% este ano, sinaliza um retorno a patamares não vistos desde a Grande Depressão.
“As novas alíquotas, que, na visão de Trump, visam proteger a indústria local, apresentam um efeito colateral previsível, podendo ser um tiro no pé: inflação mais alta e menor crescimento do próprio país”, enfatiza Cervone, chamando atenção para dados tabulados pela Fiesp. “A combinação entre tarifas elevadas e a escalada das incertezas já impacta os principais indicadores da sua economia”, ressalta.
A previsão de crescimento do PIB norte-americano para 2025 deve cair para a faixa entre 0,8% e 1,4% no pior cenário, com o núcleo da inflação podendo bater nos 4%. O índice de confiança do consumidor despencou e o dólar, contrariando expectativas de valorização com juros altos, vem perdendo força diante de outras moedas. O risco de recessão, que parecia controlado no início do ano, agora é tratado como possibilidade muito concreta por respeitados analistas, inclusive de grandes instituições financeiras e de investimentos.
No Brasil, os desdobramentos desse cenário são ambíguos. Por um lado, a queda dos juros de longo prazo nos EUA tende a aliviar a taxa interna, reduzindo o custo da dívida pública.
Além disso, a desvalorização do dólar pode contribuir para a apreciação do Real. Esse movimento teria o potencial de aliviar a inflação doméstica e, por consequência, dar fôlego à política monetária, que hoje aponta para uma Selic de até 15% em junho. Por outro lado, a desaceleração global pode pressionar os preços das commodities, afetando negativamente o saldo da balança comercial e colocando a moeda brasileira novamente sob pressão.
“Estamos diante de uma tempestade comercial que não respeita fronteiras. As medidas adotadas pelo Governo Trump comprometem a previsibilidade dos mercados e desorganizam cadeias produtivas inteiras, inclusive aquelas das quais o Brasil participa como fornecedor”, observa o presidente do Ciesp. Para ele, o protecionismo norte-americano, além de provocar inseguranças no comércio internacional, impõe desafios extras à indústria brasileira. “Há tempos já enfrentamos custos elevados e excesso de burocracia. Agora, teremos de lidar com uma reorganização do comércio internacional em um ambiente muito mais hostil.”
Cervone também destaca o impacto psicológico da medida. “A confiança dos agentes econômicos é um ativo intangível valiosíssimo. Quando é minada por decisões abruptas e isolacionistas, todos perdem”, frisa. Ele defende uma atuação coordenada do governo brasileiro com seus parceiros comerciais e instituições multilaterais para atenuar os efeitos da nova onda protecionista e preservar os interesses da economia nacional.
Enquanto a agenda de Trump apresenta promessas de desregulamentação e cortes de impostos, que, por ora, parecem insuficientes para conter os danos das disputas comerciais, o Brasil vê-se mais uma vez diante do desafio de se adaptar rapidamente a choques externos. “O que está em jogo não é apenas a competitividade do nosso país, mas sua capacidade de navegar em um cenário econômico e geopolítico marcado por turbulência, incerteza e crescente volatilidade”, afirma.