Consumidor pagará por empréstimos de distribuidoras por meio de encargo na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Já privatização deve aumentar custos de 17% a 20%.
O governo federal vai onerar os consumidores com o pagamento do socorro ao setor elétrico, além de tornar a energia mais cara caso se concretizem os planos de privatização da Eletrobras. A avaliação é de Ikaro Chaves, diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (Aesel). Em entrevista ao Vermelho, Chaves falou sobre como as duas medidas impactarão na conta de luz dos consumidores comerciais e residenciais.
Ele explica que, no caso do socorro às distribuidoras de energia, as medidas editadas pelo governo federal – a Medida Provisória (MP) 950 e o Decreto 10.350, que a regulamentou – preveem concessão de crédito a essas empresas por meio do programa Conta-Covid. No entanto, quem vai pagar por esses empréstimos é o consumidor, por meio de encargo específico dentro da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
“O setor elétrico é dividido em três partes, geração, transmissão e distribuição. A pandemia causou uma redução do consumo de energia com o fechamento do comércio, escolas, restaurantes. Como houve uma redução, a distribuidora comprou uma quantidade de energia e não tem para quem vender. Se ela comprou energia e o cliente não vai consumir, problema dela, ela deveria arcar com o risco. Mas não foi o que o governo determinou”, diz Ikaro Chaves.
Ele ressalta que para evitar um ‘tarifaço’, o que seria impopular, houve a decisão de adiar o aumento para 2021 e dilui-lo ao longo do tempo. No entanto, ele ainda cairá no colo dos cidadãos.
“O governo autorizou as distribuidoras a repassarem os prejuízos que vão ter para os consumidores. Só que não vai ser feito de uma vez. Conseguiram uma linha de crédito para diluir esse prejuízo ao longo de cinco anos. O consumidor nunca é beneficiado. Está sobrando energia e o preço sobe.”
Encarecimento
Nos planos do governo, a privatização da Eletrobras também deve deixar a energia mais cara. Segundo Chaves, a projeção é de um impacto de 17% a 20%. Ele explica que um dos motivos é que com a privatização virá o fim do regime de cotas, instituído no governo Dilma Rousseff. Nele, a tarifa cobre apenas custos de operação e manutenção das usinas.
“É muito caro fazer hidrelétrica. Mas, depois que você construiu, a energia é relativamente barata porque não gasta combustível. Algumas usinas da Eletrobras são antigas e, na renovação de contrato, passaram a vender energia mais barata. A Eletrobras é a empresa que tem mais usinas nessa situação. Ao privatizar, essas usinas vão sair do regime de cotas e vender no regime de produção independente. Então essas usinas antigas, que já estão pagas, vão cobrar mais caro”, diz.
Segundo Ikaro Chaves, a outra razão para o encarecimento é um efeito natural da privatização. “Quando você privatiza, historicamente a energia aumenta. É um setor monopolista. Quanto mais usinas se constrói, mais energia vai ter e fica mais barata essa energia. Então, ela [geradora privada] não vai investir em usinas. A Eletrobras sempre atua nos leilões de energia para oferecer o melhor preço. Uma empresa com esse tamanho, pode mudar a regra do jogo”, afirma.
Chaves diz ainda que é “uma grande mentira” a afirmação do governo de que para manter a Eletrobras estatal seria necessário fazer aportes de valores elevados. “A Eletrobras não consome dinheiro do Estado. A Eletrobras paga. Nos últimos dois anos, deu lucro de R$ 24 bilhões. Como o governo é o maior acionista, ele recebe dividendos. Vai receber R$ 1,25 bilhão só este ano”.
Ele afirma também que desde o governo Michel Temer há uma opção política da Eletrobras por não investir. “A empresa não precisa de recurso do governo para investir. Tem hoje R$ 12 bilhões em caixa pronto para investir. Por que não investe? Porque não quer. Por uma escolha política do governo. O governo Temer e o governo Bolsonaro tomaram a decisão política de não investir”.