Circula na internet um vídeo que foi parar entre as noticias de menos destaque
do site Brasil247, talvez porque seu editor duvidasse de que aquilo podia ser mesmo
verdade. Aliás, melhor seria que fosse mesmo uma invenção idiota, fakenews produzida
por algum exaltado amtibolsonarista, talvez de esquerda, para desgraçar ainda mais o ex-
presidente.
No vídeo aparece o ex-policial Evandro Guedes, do Paraná, dono do curso
AlfaCon, que preparava candidatos a concursos públicos para carreiras policiais. Pelo que
é ouvido no próprio vídeo, sabe-se que ele foi gravado durante o governo Bolsonaro. Uma
consulta atual ao Google, para verificar se o tal AlfaCon existia mesmo, reponde que “o
serviço está suspenso”, mas indagações suplementares tiveram como resposta comerciais
e vídeos que mostram aulas presenciais com muitos alunos, verdadeiros ou não, homens e
mulheres, todos jovens e sorridentes, revelando expectativas muito animadoras para o
futuro de cada um. Essas expectativas eram endossadas pelos dizeres que apareciam
nesse vídeo, segundo os quais o curso já preparou mais de duzentos mil alunos.
O curso, portanto, parece que existe mesmo – ou existiu – o que não elimina a
hipótese de o vídeo agora circulante ter sido ima produção espúria. Essa hipótese, porém,
deve ser cercada de reserva, porque o antibolsonarismo se tem mostrado completamente
infecundo na invenção do que quer que seja – tal a fartura diária de fatos verdadeiros e
documentados que desmoralizam Bolsonaro.
Voltando ao vídeo agora em circulação, ele mostra, na primeira parte o tal
professor Evandro dizendo numa aula as seguintes e inacreditáveis palavras, aqui
transcritas da notícia do 247:
— Imagina, você é virgem e passa num concurso de técnico de necrópsia, de nível
médio, cê tá lá e vem uma menina do Pânico na TV morta, meu irmão, com aquele rabão,
e ela infartou de tanto tomar bomba. Infartou na porta do necrotério, levou lá pra dentro.
Duas horas da manhã, não tem ninguém, você bota a mão, huumm, quentinha ainda. O
que cê vai fazer? Vai deixar esfriar? Meu irmão, eu assumo o fumo de responder pelo
crime.
O que na tal “aula” o tal professor sugere é que um jovem recém nomeado para o
cargo público de técnico de necropsia aproveite a solidão e a impunidade da madrugada
sem testemunhas para violentar e de certo modo estuprar o cadáver de uma jovem
mulher morta. E ele aproveita para tranquilizar os jovens alunos, garantindo que “vale a
pena’ ser processado criminalmente por essa madrugada doente e demente e responder
pela prática do crie de vilipêndio de cadáver, “porque a pena é deste tamanhozinho" – de
um a três anos de detenção, e multa, segundo o artigo 212 do Código Penal Brasileiro.
O vídeo, segundo a notícia no 247, não termina aí. Em seguida aparece Bolsonaro
em pessoa e ainda presidente, de acordo com suas próprias palavras, fazendo propaganda
do curso e desejando sorte aos alunos que fizeram provas dos concursos para Polícia
Federal e Polícia Rodoviária Federal:
— Olá, estudantes da AlfaCon – diz Bolsonaro. – Vocês que estão se preparando
para esse concurso para a Polícia Federal, boa sorte, hein! Não é impossível, não. É difícil,
e nós acreditamos em você. Estamos juntos. E o ano que vem vou dar posse pra todos
vocês. Valeu!
Mesmo um tipo insensível e casca grossa como Bolsonaro não gravaria essa
mensagem se já tivesse conhecimento do conteúdo da “aula” do brother Evandro. E não
prometeria nomear e empossar todos os alunos do AlfaCon aprovados no concurso. Como
ele só pensa nele mesmo, não percebeu que alguns “companheiros” pensam e agem da mesma maneira. E entrou de otário no golpe de um tipo que conseguiu ser mais insensível e casca grossa do que ele.
(*) Por José Augusto Ribeiro – jornalista e escritor, é colunista do Jornal Brasil Popular com a coluna semanal “De olho no mundo”. Publicou a trilogia A Era Vargas (2001); De Tiradentes a Tancredo, uma história das Constituições do Brasil (1987); Nossos Direitos na Nova Constituição (1988); e Curitiba, a Revolução Ecológica (1993); A História da Petrobrás (2023). Em 1979, realizou, com Neila Tavares, o curta-metragem Agosto 24, sobre a morte do presidente Vargas.
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