Em um movimento que levanta sérias questões sobre a governança e o respeito às instituições democráticas, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), optou por estabelecer um teto de gastos para as despesas primárias anuais do estado através de um decreto, publicado nesta quarta-feira em uma edição extra do Diário Oficial. A decisão ocorre em um momento crítico, em meio à renegociação da dívida pública do estado e à adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
Ao vincular as despesas primárias à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), Zema efetivamente congelou os salários dos servidores públicos e suspendeu a realização de novos concursos enquanto o estado estiver sob o RRF. No entanto, o uso de um decreto para implementar essa medida, sem passar pelo crivo da Assembleia Legislativa, representa uma afronta direta ao processo legislativo e à própria democracia.
Fontes próximas ao governo alegam que a decisão de Zema foi motivada pelo desejo de evitar o desgaste político em ano eleitoral, sabendo que o teto de gastos é uma medida impopular. Além disso, ao governar por decreto, o governador encontrou uma maneira mais rápida de avançar com a adesão ao RRF, evitando a discussão e o possível veto da Assembleia. Oficialmente, o governo não comentou a decisão.
A medida foi recebida com forte resistência na Assembleia Legislativa. Um projeto de lei que previa a implementação do teto de gastos estava programado para ser votado na quarta-feira, mas foi retirado de pauta pelo presidente da Casa, Tadeu Martins Leite (MDB), após a surpresa do decreto emitido pelo governador. A bancada de oposição acusou Zema de agir de forma arbitrária por não ter o quórum necessário para aprovar a proposta na Assembleia e, na mesma noite, protocolou um projeto para anular o decreto. Os parlamentares argumentam que a implementação de um teto de gastos é uma decisão que deveria ter passado pelo Legislativo, e não ser imposta unilateralmente pelo Executivo.
“Ao governar por decreto, Romeu Zema mina a democracia. Minas Gerais é o único estado que implementa o teto de gastos sem autorização legislativa. A verdade é que esse governo não tem votos na ALMG para aprovar o seu pacote de maldades, por isso decidiu agir por vias que ele considera mais fáceis”, criticou o bloco Democracia e Luta.
A situação é ainda mais delicada considerando a dívida de R$ 165 bilhões que Minas Gerais deve à União Federal. Na quarta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou o pedido do governo estadual para retomar os pagamentos a partir de 1º de outubro. No entanto, o governo de Zema busca que essa retomada seja feita de forma provisória, até que o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) entre em vigor. A proposta, já aprovada no Senado, ainda precisa ser votada na Câmara dos Deputados.
O decreto de Zema não apenas desrespeita a Assembleia Legislativa, mas também expõe um desprezo pela participação democrática no processo de tomada de decisões que afetam diretamente a vida dos mineiros. Governar por decreto, especialmente em questões de grande impacto como o teto de gastos, enfraquece as instituições e ignora a necessidade de diálogo e consenso que deveria nortear a administração pública.